Depois de um ano atípico, em que os sobressaltos climáticos e a tensão com a oferta ao redor do mundo provocaram uma disparada jamais vista nas vendas antecipadas de soja no Brasil, 2014 deve ser marcado pela volta do ritmo de comercialização às médias históricas. Cálculos da consultoria Céleres apontam que 42% da safra 2013/14 da oleaginosa – cuja colheita começou há poucos dias – foi negociada até meados de janeiro no país, bem abaixo dos 57% do mesmo período de 2013, mas muito próximo dos 40% da média dos últimos cinco anos.
A baixa nos preços da soja na bolsa de Chicago (em 2012/13, a commodity bateu recorde a US$ 17 por bushel, mas agora recuou para perto de US$ 13 por bushel) e a capitalização dos produtores aumentaram a cautela com as vendas. “Os agricultores vêm de anos seguidos com boa rentabilidade, por isso têm fôlego para segurar a soja”, explicou Anderson Galvão, CEO da Céleres.
Em Mato Grosso, maior produtor nacional do grão, a comercialização está 14 pontos percentuais aquém do ano passado, de acordo com o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea). Cerca de 55% da safra já foi negociada (o equivalente a 14 milhões de toneladas), mesmo patamar da média dos últimos cinco anos. Até o momento, as vendas foram efetivadas à cotação média de R$ 45,47 por saca, 5,8% abaixo da média de R$ 48,26 do mesmo período da safra passada, a 2012/13 – que chegou a registrar negócios por até R$ 63 por saca.
Há alguns dias, os preços até reagiram e se aproximaram de R$ 50 por saca na região de Sorriso, um dos principais polos produtores de Mato Grosso. Na avaliação de Daniel Latorraca, gestor do Imea, essa alta poderia estimular as vendas, mas o que se vê é um mercado bastante parado. “O fato é que os produtores estão focados na colheita, inclusive para plantar com tranquilidade o milho safrinha, que vem na sequência”, explicou.
Os traders, por sua vez, também estão realizando os contratos já travados, por isso os negócios não avançam. A colheita de soja alcança 4% da área cultivada no Estado, enquanto o plantio de milho safrinha não chega a 1%.
Assim como em Mato Grosso, na Bahia as vendas futuras já comprometeram mais da metade da colheita, estimada em 4,4 milhões de toneladas. Em torno de 55% da produção baiana já foi negociada, atraso de 10 pontos percentuais ante 2012/13, de acordo com Ernani Sabai, diretor de projetos, integração e pesquisa da Associação dos Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba). Os valores oscilam entre R$ 55 e R$ 59 por saca.
Já no Paraná, somente 23% da safra já foi comercializada antecipadamente, aquém dos 35% do mesmo período do ano passado e também dos 28% da média dos últimos anos. Conforme Juliana Yagushi, analista do Departamento de Economia Rural (Deral), ligado à Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Paraná, os agricultores comercializaram o suficiente para cobrir os custos. “Eles acreditam que os estoques internacionais baixos e a demanda firme, em especial da China, devem favorecer as cotações no segundo semestre. Assim, preferem esperar para realizar novas vendas”, disse.
No caso da Cocamar, cooperativa agrícola com sede em Maringá (PR), embora as negociações estejam menos intensas, os preços estão mais atraentes. Os 15% da produção vendidos até agora (cerca de 129 mil toneladas) saíram a uma média de R$ 59 por saca, acima dos R$ 52 do mesmo período do ano passado, quando 20% da safra 2012/13 já havia sido contratada.
Na avaliação de Antônio Sérgio Bris, gerente comercial de grãos da Cocamar, o câmbio tem feito a diferença: um ano atrás, o dólar estava cotado a cerca de R$ 2,00, e agora, tem oscilado entre R$ 2,35 e R$ 2,40. “Teve gente que até vendeu soja para pagar as despesas com a última safra de inverno de milho”, contou. Com a valorização da moeda americana, os produtores se animam em fechar negócios porque recebem o mesmo em real, com menos produto entregue.
No Rio Grande do Sul, as vendas de soja estão praticamente no mesmo ritmo do Paraná, com 25% da produção (ou 3,37 milhões de toneladas) já comprometida, 10 pontos percentuais abaixo do mesmo período do ciclo passado, nos cálculos da consultoria Safras & Mercado. Em Mato Grosso do Sul, a comercialização chega a 35% do volume previsto para a safra, atraso também de 10 pontos ante 2012/13, conforme a Aprosoja/MS, associação que representa os produtores locais. O preço médio para entrega futura no Estado está em R$ 52 por saca.
“Nesse momento, os produtores também preferem aguardar a colheita para ter certeza da produtividade e da qualidade dos grãos”, diz Alexandre Bueno Magalhães, da corretora Grãos de Ouro, de São Gabriel do Oeste (MS).
O motivo, acrescenta, é a pressão exercida por esmagadores e produtores de ração, que querem garantia de entrega da matéria-prima para fechar contratos de fornecimento. As fábricas gaúchas, por exemplo, querem receber soja até 31 de janeiro. “Então, em nossa região, temos que ter colhido até 25 de janeiro para garantir a entrega. Como as chuvas atrapalham os trabalhos, agora só fecho com quem tem grão nos silos”, conta.
Fonte: Valor Econômico – 27/01/2014
Comentar