“A contribuição do resto do mundo para o Brasil é positiva, mas se você olha a economia brasileira, é um show de horrores”. A frase do consultor da MBAgro, Alexandre Mendonça de Barros, doutor em economia aplicada, ilustra bem a situação vivida pelo país nos últimos meses. Convidado para apresentar um quadro da conjuntura agropecuária para uma plateia formada por produtores rurais paranaenses durante a posse da nova diretoria da FAEP, ele apontou riscos e oportunidades para o agronegócio brasileiro em meio a um cenário bastante paradoxal, onde “todas as variáveis macroeconômicas estão fora do lugar”.
Segundo Barros, o mundo está passando por importantes mudanças que terão forte impacto na atividade agropecuária brasileira. A principal delas é a recuperação dos EUA após a recessão de 2008. Para tanto, o governo norte-americano estimulou o consumo e reduziu o custo do capital. Após um primeiro ciclo de desvalorização do dólar, com a impressão violenta da moeda, o país entrou num segundo ciclo, onde ela passou a ficar mais valorizada. “A economia americana reencontrou sua trajetória de crescimento a longo prazo”, observa.
No Brasil, o desequilíbrio econômico é profundo. A previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano é de -1%, podendo chegar a -3%, segundo o analista. Enquanto a economia encolhe e a inflação bate na casa dos 8%, o governo sobe a taxa de juros, dificultando ainda mais o fechamento das contas públicas. Esse quadro leva a uma situação paradoxal, segundo o analista: “Como é que a economia está indo tão mal e a agricultura não está sofrendo tanto?”, questiona.
No presente momento, os produtores brasileiros gozam de uma situação fora do comum. Enquanto o preço das principais commodities despencou na Bolsa de Chicago, a alta do dólar em relação ao real manteve altos os preços para as vendas dos produtos brasileiros. Nesse caso, segundo o analista, “o desequilíbrio econômico brasileiro salvou a safra”. É bom lembrar, porém, que este deve ser um efeito passageiro. “Já esticou demais (o preço do dólar)”. O real se desvalorizou sem que a taxa de juros nos EUA tenha subido. “Provavelmente em 2015, 2016 esses juros devem voltar a subir”, prevê.
Este, segundo Barros, é o único reflexo positivo da condução econômica do governo federal. Suas consequências, em curto prazo, são o aumento da carga tributária para promover o ajuste fiscal, e a diminuição da oferta de crédito “Os bancos estão refratários e o BNDES não terá os aportes do Tesouro que teve anteriormente”, analisa.
Para Barros, o cenário político é o grande empecilho para que este e outros problemas venham a ser resolvidos. “Se o (ministro da Fazenda) Joaquim Levy está fazendo um ajuste fiscal grande e o Congresso joga contra, então a tendência é de muita tensão. Enquanto esta tensão estiver premente, o câmbio pode subir”, afirma.
Além da falta de capacidade de articulação política, o governo federal abusa da lógica e desrespeita a inteligência do povo brasileiro ao buscar fantasmas para explicar o encolhimento da economia. Questionado por um dos presentes sobre a explicação da presidente Dilma que – em cadeia nacional – atribuiu a má fase da economia a uma suposta crise externa, respondeu: “É vergonhoso o governo falar que a crise interna é reflexo de uma crise internacional. Sob qualquer critério que você queira ver, é uma mentira completa”.
Para Barros, o caminho para um ajuste sério, se houver comprometimento – leia-se condições políticas – levará no mínimo três anos. “Esse é o maior ajuste fiscal desde o plano real. Não é um desenho bonito de país”, avalia.
Soja
Quando questionado pelos participantes sobre o cenário futuro para a soja, Barros avalia que o mercado vai ficar estável. Ele calcula que a safra brasileira será em torno de 92 milhões de toneladas, um pouco abaixo da previsão da Conab, o que não mudaria muito o quadro internacional de preço da oleaginosa. No curto prazo talvez o preço caia um pouco porque a safra brasileira vai começar a escoar de fato. “Mas a conversa toda nos próximos meses é: quanto os EUA vão plantar?”, questiona. Segundo ele, houve um encolhimento na área plantada de todas as culturas nos EUA, inclusive a soja. “O preço em dólar caiu muito, as margens dos produtores ficaram muito mais comprimidas”, explica. “O preço da soja vai depender da curva de câmbio”.
Fertilizantes
“Houve uma acomodação no preço das commodities, mas não vimos uma queda proporcional no preço dos fertilizantes”, observa Barros. Ele acredita que os preços em dólar não devem cair. Segundo ele, a China abriu a janela de exportação de fertilizantes, possivelmente para tributar esses produtos em um futuro próximo, o que iria encarecer estes insumos.
Para o analista, a indústria brasileira de fertilizantes tem um dilema pela frente, pois os produtores estão deixando as compras para depois. “Nos últimos quatro anos as empresas traziam o adubo já vendido, agora vão ter que trazer e depois vender”. “Se o produtor empurrar com a barriga a decisão da compra, vai ser uma correria na hora da entrega. Isso quer dizer que na boca da safra pode aumentar o preço dos fertilizantes”, avalia.
Leite
No caso dos lácteos, o analista observa uma queda no preço, saindo do patamar de US$ 5 mil para US$ 3 mil a tonelada. “Se o câmbio ficar onde está, o preço equivalente ao leite interno vai ser R$ 1,10, o que é bem razoável”. Na sua opinião, o mercado está sentindo que o consumidor não está mais comprando tanto produtos nobres, como iogurtes, etc. “O consumidor está baixando o padrão. O aperto de renda está cobrando o seu preço”, diz.
Carne bovina
No que se refere à carne bovina, Barros é muito otimista com o mercado. Grandes produtores, como Austrália e EUA estão com os menores rebanhos em muitos anos. “Falta carne no mercado internacional. Aqui, com a desvalorização do dólar, fica barato produzir”, avalia. Na opinião do analista “Nunca vi um ano tão favorável para abrir novos mercados para a carne brasileira”.
Comentar