A firme recomposição da oferta global continua a tirar sustentação dos preços internacionais de milho, trigo e soja, os principais grãos comercializados no exterior. Positiva para empresas que processam essas matérias-primas ou as utilizam como insumo – e do ponto de vista inflacionário -, a tendência, que já derrubou as cotações ao menor patamar em quatro anos, tira o sono de produtores e exportadores, que nos últimos anos trabalharam com margens em geral mais confortáveis. No mercado, grande parte das projeções sinaliza que esse movimento deverá marcar não só a safra 2014/15, cuja colheita já foi iniciada no Hemisfério Norte e que começará a ser plantada no Hemisfério Sul em setembro, mas duas ou três temporadas.
Na bolsa de Chicago, principal referência para os preços desses três produtos básicos nas alimentações humana e animal, as quedas continuam a se aprofundar. Cálculos do Valor Data baseados nas médias mensais dos contratos futuros de segunda posição de entrega (normalmente os de maior liquidez) mostram que milho e soja encerram agosto (o balanço foi fechado ontem) com quedas em relação a julho, enquanto o trigo permanece praticamente estável. Mas o trio já aparece com retrações de dois dígitos nas comparações com as médias de dezembro e de agosto do ano passado.
Com o recuo de agosto (3,84%), o quarto mensal consecutivo, a média dos futuros de segunda posição do milho passam a acumular baixa de 21,40% sobre agosto de 2013. No caso da soja, também em queda livre desde maio, os recuos são de 8,84% e 16,72%, respectivamente, ao passo que a média do trigo, mesmo com uma alta marginal neste mês (0,98%), garantida pelas tensões entre Rússia e Ucrânia – dois dos maiores produtores globais do cereal -, é 14,25% menor do que há um ano. Em julho, a média mensal do trigo foi a menor desde junho de 2010. A média do milho em agosto desceu ao mesmo degrau, enquanto na soja é o mais baixo desde setembro de 2010, conforme o Valor Data.
Em virtude dos fundamentos “baixistas”, resultado do forte ritmo de crescimento da oferta, superior ao da demanda, os investidores continuam a fugir da soja e do milho. Conforme a Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CFTC), os gestores de recursos (“managed money”) encerraram a semana de 19 de agosto no mercado de soja na bolsa de Chicago com saldo líquido vendido de 16.698 contratos (entre futuros e opções), 42,6% superior ao da semana anterior. É um patamar inferior ao pico de 18.543 contratos vendidos da semana até 22 de julho, mas a tendência é que o saldo negativo seja ampliado.
Em meados de julho, a soja passou a registrar saldo vendido pela primeira vez em 2014, já diante da sinalização de que a safra (2014/15) dos Estados Unidos seria abundante, como de fato está se confirmando. De acordo com o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), as lavouras americanas da oleaginosa estão nas melhores condições já registradas para este período do ano. Além disso, já pesa sobre as cotações a indicação de que também a produção brasileira poderá bater um novo recorde, tendo em vista a expectativa de mais um crescimento da área plantada no país em 2014/15.
Os fundos também estão menos animados em relação à valorização do milho. A posição líquida de compra do grão recuou 4,35% em Chicago na semana até o dia 19 de agosto, para 64.719 contratos. Foi a terceira semana de queda nas apostas altistas no milho. No trigo, a continuidade da crise entre Rússia e Ucrânia e as chuvas durante a colheita na Europa são fatores que passaram a conter a espiral baixista, pelo menos temporariamente. Assim, o saldo líquido vendido do trigo brando caiu 17,1% em relação à semana anterior, para 50.668 contratos, enquanto o saldo comprado do trigo duro aumentou 15,4%, para 15.421 contratos.
Na bolsa de Nova York, também diminuiu a crença na ascensão do algodão. Na semana até 19 de agosto, a posição líquida da fibra alcançou 7.404 contratos vendidos, 29,2% mais que na semana anterior. Entre o fim de julho e o início de agosto, o algodão passou a registrar saldo vendido pela primeira vez no ano. A perspectiva de um bom volume colhido nos EUA e as indefinições quanto a subsídios na China têm guiado esse movimento, e a cotação média dos papéis de segunda posição do produto encerra o mês com queda de 4,54% em relação a julho.
Outra commodity referenciada em Nova York que está afugentando investidores é o açúcar, apesar das perspectivas de déficit global na safra 2014/15. Na semana até o dia 19, o saldo líquido vendido na bolsa foi de 27.327 contratos, conforme a CFTC, 53,9% acima da semana anterior, e esse movimento colabora para que a commodity caia 5,33% sobre julho. Desde fevereiro, as expectativas para os preços não eram tão pessimistas. De maneira geral, o clima continua favorável à colheita e ao processamento de cana no Brasil (maior produtor mundial), enquanto os compradores permanecem bem abastecidos.
No caso do suco de laranja e do café arábica, cresceu o otimismo dos fundos, por conta da temporada de furacões nos EUA (suco) e da expectativa de novos problemas climáticos no Brasil (café). O saldo líquido vendido da bebida recuou 22,8% na semana encerrada em 19 de agosto, para 1.145 contratos, e o saldo comprado do grão subiu 0,58%, para 41.659 contratos. A cotação média do café sobe 10,19% sobre julho, mas a do suco ainda é 2,42% menor. No mercado de cacau, finalmente, a posição líquida comprada diminuiu 3,08%, para 70.923 contratos, mesmo com as preocupações com os casos de Ebola na África, onde estão os principais produtores mundiais. Esses temores, porém, já motivam uma alta de 3,24% do preço médio do produto em Nova York no mês.
Fonte: Valor Econômico
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