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O difícil cenário para o câmbio

Normalmente, o crescimento rápido das importações não deveria trazer problemas para uma economia que cresce também rapidamente e, mais ainda, de forma robusta como vem acontecendo com a economia brasileira neste primeiro ano pós-crise financeira mundial.

Apesar dessa verdade simples, somos obrigados a reconhecer que o aumento recente das importações de bens de consumo está se tornando uma das dificuldades maiores que a economia brasileira enfrenta no atual momento.

O fato de essas importações já responderem por aproximadamente 20% do que o mercado interno está consumindo não é o maior problema.

O que é complicado nesse caso é que esse tipo de importações está desconstruindo segmentos importantes de um setor industrial sofisticado que nós levamos décadas para desenvolver.

Isso se deve a que o câmbio tem estado sobrevalorizado por tempo demasiado.

Já veio do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, que permitiu essa tragédia.

Nós tivemos o câmbio sobrevalorizado todo esse tempo, e mesmo no governo de Luiz Inácio Lula da Silva nós estamos mantendo o real supervalorizado há um ano e meio ou dois anos.

Não é que essa política seja mantida porque este seja o desejo dos governos, mas porque os mecanismos que estão construídos tornaram isso factível: um enorme diferencial entre as taxas de juros interna e externa, que atrai esse capital e que valoriza o câmbio, além de dificultar nossas exportações e facilitar as importações.

Esse problema tornou-se muito maior do que o próprio câmbio quando hoje vemos alguns estados competindo para conceder subsídios às importações.

Além da valorização do câmbio passamos a ter as dificuldades dessas concessões que dão subsídios às importações desde que entrem em certos portos brasileiros.

Estamos deixando que essas coisas cresçam de uma maneira insensata no Brasil, permitindo a desmontagem de uma estrutura sofisticada que a indústria brasileira construiu durante tantos anos de desenvolvimento continuado.

O problema da valorização do real é muito mais sério do que a maioria dos economistas acredita.

Nós nos tornamos um caso escandaloso de câmbio sobrevalorizado, ignorando as consequências de um fato extremamente grave.

Esse fato grave é: o Brasil está atualmente caminhando para uma situação delicada diante do crescimento do déficit em conta-corrente, enquanto, ao mesmo tempo, faz questão de não ver o risco de manter o câmbio sobrevalorizado 20%.

Ao mesmo tempo, o câmbio chinês, na outra ponta, está desvalorizado em torno de uns 40%.

A diferença entre os preços do Brasil e da China não tem nada que ver com competência empresarial ou eficiência produtiva.

O real está tão valorizado e o dólar tão desvalorizado que nos tornamos o país que mais contribui para o superávit comercial norte-americano.

Os Estados Unidos estão se preparando para um grande programa de exportação desvalorizando o câmbio, cientes de que vão ter de desvalorizar o dólar ainda mais porque a China não dá confiança aos norte-americanos e mantém o iuane ligado à moeda americana.

Com essa estratégia, quando o dólar se desvaloriza o chinês desvaloriza junto, o que está causando uma perturbação enorme no mundo inteiro.

É a isto que o nosso ministro da Fazenda, Guido Mantega, chamou com toda a razão de "guerra cambial".

Essa "guerra" caminha para terminar numa guerra comercial, ameaçando o mundo com a reedição do que houve de pior na Grande Depressão dos anos 1930 do século passado: o desemprego amplo, geral e irrestrito.

Fonte: Jornal DCI
Por Antônio Delfim Netto

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