Um mês depois de ter participado do lançamento da ExpoLondrina, o ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro, volta hoje ao Paraná, desta vez para um encontro em Curitiba. Bastante diversificada, a pauta pretende tratar das potencialidades e gargalos do agronegócio paranaense a partir da realidade de várias cadeias produtivas. Contudo, entre os temas que devem dominar os debates, o destaque é o trigo. A Secretaria Estadual da Agricultura (Seab) convoca a imprensa para o anúncio do Plano Safra do Trigo. O Ministério da Agricultura (Mapa) encara como o anúncio de medidas de apoio à triticultura. A considerar que quase metade da área destinada à cultura no estado já foi cultivada, o discurso do Mapa me parece mais coerente. Não lógico, porque qualquer medida de estimulo e incentivo deveria anteceder o plantio.
De qualquer forma, há expectativa. Até porque a cadeia produtiva está fragilizada, desacreditada e perdendo a esperança de que um dia o Brasil terá uma política agrícola para o trigo condizente com a importância econômica e social da atividade. O encontro de hoje, então, representa uma grande chance e um bom momento para o ministério surpreender – embora a cadeia produtiva tenha a consciência de que as definições para o trigo vão muito além das competências do Mapa. Quando o assunto é preço mínimo, seguro rural e recursos de apoio ao custeio e comercialização, por exemplo, quem manda é o Ministério da Fazenda.
Foi justamente pela falta de incentivo, realidade que a triticultura enfrenta há décadas, que a produção se acomodou. O mais correto talvez seja dizer "se conformou". Porque não dá para se acomodar produzindo apenas 50% do volume demando pelo mercado interno. Hoje a situação parece confortável porque trazemos trigo da Argentina, Paraguai e, se precisar, do Canadá e até da Rússia. Contudo, ampliamos cada vez mais nossa dependência do cereal importado, em volume que nos deixa reféns do comércio internacional e fere nossa soberania, uma vez que se trata de um produto de necessidade básica, de saúde e segurança alimentar. Em 2012, a produção nacional de trigo está estimada em pouco mais de 5 milhões de toneladas, para um consumo acima de 10 milhões de toneladas.
Mas não tenho dúvida que daqui a pouco o trigo produzido no estado e no país vai realmente fazer falta. Com a redução na produção e o consequente aumento da dependência externa, a cadeia perde força na base e provoca um efeito dominó que vai parar na outra ponta, a do consumo. Mas antes de chegar à mesa do consumidor, o efeito colateral terá de ser vencido pelos moinhos. Sem oferta interna ou com uma oferta reduzida, não será mais o produtor, mas os moinhos que ficarão reféns do processo. Para fazer girar as moegas, terão que se submeter cada vez mais às regras que serão impostas pelos fornecedores. Ou seja, o cenário pode ficar ainda mais desfavorável e exigir intervenções mais profundas e onerosas por parte do poder público.
Como conter o revés da triticultura paranaense e nacional? É possível, mas não com intervenções. No ponto em que chegou, será necessária a reestruturação da cadeia, em todos os seus elos, do produtor à indústria, da pesquisa à assistência técnica e extensão rural. Informações organizadas pela Federação da Agricultura do Paraná (Faep) revelam que mais de 60% do trigo utilizado pelos moinhos do estado tem origem nos campos paranaenses. Ou seja, a produção local é vital para o abastecimento da indústria local, embora a cadeia esteja trilhando um caminho inverso. Esse mesmo estudo, traduzido num artigo da economista Tânia Moreira e do agrônomo Leandro Alegransi, mostra que em apenas três safras o cereal perdeu 440 mil hectares no Paraná. A persistir o desinteresse, em menos de uma década a cultura do trigo pode ser dizimada no estado.
Dos 357 moinhos em operação no país, 72 estão no Paraná, que já foi o maior produtor nacional. Foi desbancado pelo Rio Grande do Sul, principalmente pela extensão menor dedicada ao cereal pelos paranaenses – que substituem o trigo pelo milho de 2.ª safra, que nas últimas três temporadas ganhou quase 400 mil hectares. Uma área quase igual à do recuo do trigo no período. Aí, temos outro problema. O da monocultura da soja no verão e do milho no inverno. Um sistema de produção de alto risco, mais suscetível a frustrações climáticas e extremamente frágil do ponto de vista agronômico.
Nem tudo está perdido. As cooperativas paranaenses estão investindo em novos moinhos. Isso não significa que elas vão garantir preço e rentabilidade ao produtor. Elas vão operar nas regras e condições de mercado. A diferença é que vão oferecer ao produtor a garantia primordial para investir na cultura, que está na compra do produto. Com mais alternativa industrial dentro do sistema, as cooperativas vão, naturalmente, influenciar o mercado e valorizar a produção interna. Serão mais moinhos disputando o produto local e, por consequência, garantindo maior liquidez ao produto.
Enfim, pode ser uma saída interessante. De qualquer forma, será preciso uma solução partilhada, em ações e responsabilidades, junto com os governos, estadual e federal. Regras como de importação, preço mínimo, seguro, classificação e cabotagem – operação logística que dificulta o escoamento do trigo da Região Sul para o Norte e Nordeste – exigem um posicionamento mais claro e efetivo do poder público para serem implementadas. No mais, pode deixar com o produtor.
Fonte: Gazeta do Povo Online – Curitiba/PR – COLUNISTAS
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