A cotação da carne bovina ultrapassou todos os seus limites e está rondando os R$ 150 por arroba no Paraná. Não há sinal de queda nos preços há mais de dois anos, mas falta boi no pasto.
A valorização da carne tem sido contínua e, com novo impulso da alta do dólar, estende o convite à expansão da bovinocultura. A força da escalada dos preços apresenta uma questão: por que o setor não programou incremento no rebanho?
A cotação média anual nunca havia chegado perto de R$ 100 no Paraná até 2013, quando alcançou R$ 99,69. A redução de 10% no rebanho de corte em dez anos mostra que o setor ainda não respondeu a esse apelo do mercado.
De 2004 a 2013, o plantel total do estado, hoje estimado em 9,39 milhões, perdeu 880 mil cabeças. E o gado de corte, por sua vez, caiu de 7,7 milhões para 7 milhões de cabeças. Um recuo que se somou aos fatores que elevaram o preço da carne no mercado internacional, inclusive em regiões onde houve expansão da atividade.
O momento agora é de reação, mesmo onde o rebanho vinha encolhendo. Prova disso é o preço do bezerro, que ultrapassou R$ 1 mil com reajustes 30% maiores que os da arroba do boi gordo (veja infográfico na página 19).
As razões para o recuo são simples. Considerando os custos e a rentabilidade de outras atividades, a pecuária valia pouco a pena enquanto a arroba estava abaixo de R$ 100, aponta o produtor Antônio Sampaio, de Londrina (Norte). Ele reduziu seu rebanho de 600 para 100 cabeças e destinou 285 hectares de pasto para grãos, que agora ocupam praticamente toda sua propriedade. “Quem tinha área boa de lavoura foi para a soja e quem não tinha acabou mudando para a cana”, comenta.
O Paraná abateu 200 mil matrizes nos últimos 2 anos – o que significa 100 mil bezerros a menos por ano. Se hoje há falta bezerro é porque faltou planejamento, avalia o zootecnista Paulo Rossi, coordenador do Labo-ratório de Pesquisas em Bovinocultura da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o LapBov.
Seja para reduzir ou para expandir a produção, o setor precisa se pautar em indicadores de longo prazo, considera. “Sabíamos da situação, mas não conseguimos nos antecipar. Poderíamos ter diminuído o rebanho, mas para isso teríamos que aumentar a produtividade”, crava Rossi.
Embora não haja avaliações precisas sobre o tamanho do espaço que a pecuária tem para se expandir, o consenso é que a tendência ainda é de alta nos preços. O aumento nas exportações, neste momento, soa como agravante da escassez na oferta. Os embarques, ainda que considerados fracos para o tamanho do rebanho, cresceram 32,4% nesta década, de 22,2 mil toneladas (2010) para 29,4 mil toneladas (2014). Apesar disso, a participação do estado nas exportações brasileiras ainda é pequena, de 1,9%.
Atenuantes
Se não houver reação, o Paraná pode se tornar um comprador assíduo de carne de outros estados, cogita o presidente da Sociedade Rural do Paraná (SRP), Moacir Sgarioni. “O produtor que sai da pecuária não volta. A agricultura tem sido mais rentável”, avalia.
Para Sgarioni, existem alternativas que podem estimular a produção além dos preços recordes: investimentos em reprodução e redução de impostos sobre a circulação dos animais. “É muito caro comercializar um bezerro de uma região para outra. No Paraná, pagamos 12% de ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços]”, reclama.
Motivação
O consultor da Associação Brasileira de Criadores de Zebuínos (ABCZ) em Londrina, Gustavo Garcia Cid, acredita numa recomposição do rebanho nos próximos anos por conta dos preços, o que ajudaria a tornar a cadeia toda mais lucrativa, e não apenas uma ponta dela. “[Quando os ganhos são limitados], se o vendedor de bezerro ganha muito, alguém está perdendo”, frisa.
Garcia Cid, no entanto, avalia que os preços não devem frear o consumo. “Aqui no Brasil, isso pode ocorrer um pouco, com a migração para outras proteínas, como o frango e suíno. Mas o consumo mundial é menos flexível”, acrescenta.
O consenso é que as cotações abrem espaço para o Paraná retomar a produção de carne bovina com mais planejamento e sustentabilidade. “É uma grande oportunidade de se consolidar, dez anos depois da crise da aftosa [que se deflagrou em 2005 e atingiu em cheio o estado em 2006]”, avalia Rossi, do LapBov. Hoje, o estado encontra-se na 11.ª colocação no cenário nacional, com apenas 4,4% do rebanho brasileiro e pouco mais de 1 milhão de cabeças abatidas anualmente.
Para quem ficou, hora de colher os frutos
A redução da cria e recria de bovinos surte efeito na ExpoLondrina, com queda no número de animais expostos desde o ano passado. Neste momento, essa escassez tem seu lado positivo, afirma o presidente Sociedade Rural do Paraná. “Muitos criadores estão vendendo direto nas propriedades, o mercado está mais comprador. Isso faz com que ele evite gastos com a logística”, analisa Moacir Sgarioni.
A demanda é considerada forte. “Nunca tinha visto uma procura como essa. Hoje o pessoal reserva o bezerro dentro da barriga da vaca”, conta o produtor Alexandre Turquino, cuja família trabalha com pecuária de corte há mais de 40 anos na Região Norte do Paraná. Os períodos de baixa são considerados sazonais. “A gente continua, não adianta ficar pulando de galho em galho.”
Turquino não só permaneceu como resolveu investir na bovinocultura. Ele atua em duas propriedades, uma no Mato Grosso do Sul, onde cria as matrizes, e outra no Paraná, em Bela Vista do Paraíso, destinada à engorda.
“A gente viaja e acompanha. Eu vi que isso iria acontecer. No Noroeste do Paraná, por exemplo, antes tinha muito gado e agora é só soja e cana. Então, resolvi apostar no retorno da bovinocultura”, conta. Nos últimos cinco anos, aumentou de 2 mil para 3 mil o número de matrizes. Ao todo, o rebanho está com 5 mil cabeças: “Agora estamos começando a pagar as contas”, pondera.
211,8 milhões
de cabeças é o tamanho do rebanho bovino brasileiro, conforme o IBGE – o segundo maior plantel do mundo. O país é o maior exportador da carne do mundo, com 2,03 milhões de t. embarcadas em 2014, segundo o Usda.
Fonte: Gazeta do Povo
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