As exportações brasileiras de soja em grão deverão atingir recorde de 38,2 milhões de toneladas no ano comercial que começou em fevereiro deste ano e vai até janeiro de 2014. A quantidade projetada pela Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove) é 20% acima da registrada do período comercial anterior. Os embarques deverão representar quase metade (46,5%) da produção total de soja do país, estimada em 82,1 milhões de toneladas, também no maior nível histórico.
O Brasil se beneficia do preço da soja ainda em patamares consistentes diante da reduzida oferta do grão no cenário internacional, condição que deve continuar, pelo menos, até a colheita da safra dos Estados Unidos a partir de setembro. No entanto, os lucros dos produtores ficarão aquém das expectativas por causa da alta nos custos da logística. Os congestionamentos nas estradas, armazéns insuficientes e longas filas para carregamento dos navios nos portos causam impacto negativo nos resultados.
"As tradings estão pagando cerca de R$ 55 por saca de soja. O preço seria R$ 61 considerando o custo do transporte no ano passado. Por causa do acréscimo no frete em 2013, os produtores perdem seis reais por saca", destaca Ricardo Tomczyk, vice-presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT). O Estado é responsável por um terço da produção nacional de soja.
Mais de 60% das compras do grão foram feitas antecipadamente pelas tradings a preços fixados ainda em 2012, com base no cálculo da média do frete naquele período. Desta forma, grande parte do custo adicional com transporte vem sendo arcado por essas empresas. No entanto, os produtores que negociam soja este ano são penalizados, uma vez que as tradings descontam deles as despesas logísticas, diz Tomczyk. O frete das áreas produtoras aos portos já sai entre US$ 100 a US$ 150 por tonelada, conforme Fábio Trigueirinho, secretário geral da Abiove. "Um terço da renda do produtor vai para o pagamento de transporte".
A situação pode ficar mais complicada caso a safra americana se confirme positiva. Com maior oferta no mercado mundial a partir de setembro, a tendência é que as cotações da soja caiam, apertando a margem de lucro dos produtores, alerta José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). "Se houver queda do preço final da soja e o custo do frete não cair, o que é mais provável porque não se cria infraestrutura de uma hora para outra, será que o Brasil vai conseguir produzir a mesma coisa?", questiona. Segundo Castro, a produção avançou recentemente apoiada no preço elevado da soja, o que compensou a logística cara e o real valorizado. Ele pergunta: "Se o preço da soja cair, o país continuará competitivo?"
Para Glauber Silveira, presidente da Aprosoja Brasil, chegou-se ao limite estrutural. "Não adianta ampliar a produção se não temos como escoar", afirma.
Além do aumento do volume do grão, houve deslocamento do calendário da commodity. As fortes chuvas atrasaram o plantio e a colheita da soja no Mato Grosso, fazendo com que a produção ganhasse fôlego somente em março, quando o atraso dos navios no porto de Paranaguá ficou ao redor de 70 dias. Em abril, contudo, houve uma certa compensação com aumento dos volumes embarcados. Na média, o tempo de espera nos portos têm sido de 45 a 60 dias, prazos já incorporados nas negociações.
A Aprosoja do Mato Grosso confirma que houve alguns cancelamentos das compras pela China no pico dos atrasos. "Ocorreram cancelamentos com a alegação de descumprimento dos prazos estabelecidos em contrato", afirma Tomczyk. Em um primeiro momento, foram anunciados cancelamentos de 2 milhões de toneladas (pelo grupo chinês Sunrise), mas segundo Tomczyk as rescisões teriam atingido 600 mil toneladas. "Algo até pontual em relação ao tamanho da safra", diz.
Entretanto, para o presidente da AEB, o número de contratos cancelados é maior. "Infelizmente foram pouco divulgados porque isso não é bom para a imagem das empresas", comenta José Augusto de Castro. Ele ressalta que o fato dos chineses chegarem ao ponto de cancelar as compras e serem pouco tolerantes tem por trás uma busca de vantagem. "O Brasil tinha vendido soja por um preço maior. Como descumpriu prazos de entrega, os chineses cancelaram contratos para recomprar depois por preços mais baixos", ressalta. De acordo com o senador Blairo Maggi (PR-MT, "o cancelamento de encomendas representa não apenas prejuízo material imediato, mas impacta negativamente nossa credibilidade e afugenta novos negócios".
No curto prazo, para diminuir o gargalo nos portos, Glauber Silveira defende o investimento em coberturas, o que permitiria o carregamento dos navios mesmo nos dias chuvosos, sem risco de deteriorar as cargas. Segundo Sérgio Mendes, diretor da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), há estudos para que coberturas sejam instaladas no Porto de Paranaguá. A ampliação da capacidade de armazenamento também é fundamental e pode ser feita no médio prazo. "Com estrutura de armazenagem adequada é possível fazer a contratação do frete de forma mais racional, distribuída ao longo do ano", diz Mendes.
Hoje, sem espaço suficiente para colocação do grão, os caminhões e os portos são intensivamente demandados, o que encarece o frete. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) anunciou no início do mês que investirá cerca de R$ 350 milhões na construção de dez novos armazéns. O governo federal incentivará a construção de armazéns privados oferecendo linhas de crédito especiais. Contudo, as soluções mais eficazes apontadas por especialistas são a ampliação dos modais hidroviário e ferroviário e o desenvolvimento dos portos no Norte do país. "Pelo menos 20% tem que sair pelo Norte para desafogar os portos de Santos e Paranaguá", avalia Glauber Silveira.
Valor Online
Comentar