Guerino Guandalini teve uma trajetória exemplar de participação e luta em defesa dos produtores rurais e da agropecuária do Paraná, que permitiu construir uma história que se confunde com a do próprio setor. Afinal, o líder rural comandou o Sindicato Rural de Astorga por mais de 40 anos e ocupou a vice-presidência da FAEP por mais de 30 anos. No dia 17 de abril, Guandalini faleceu, aos 91 anos, deixando uma lacuna no sistema sindical rural paranaense que nunca será preenchida. Guerino participou, liderou, deu exemplo, e ao final, deixou uma marca indelével.
Guerino era o nosso professor, uma referência, verdadeiro exemplo para nós. Era um homem incansável, líder nato, que sempre inspirou aqueles que estavam em volta. O Guerino fez parte de todas as grandes mobilizações do agro paranaense, sem nunca medir esforços para defender os direitos e interesses dos agricultores e pecuaristas do Paraná.
Ágide Meneguette, presidente do Sistema FAEP/SENAR-PR
Nascido em Taquaritinga, no Estado de São Paulo, em 1933, Guandalini desembarcou em Londrina, no Norte do Paraná, aos 13 anos. Três anos depois, em 1949, seguiu para Astorga, na época um distrito de Arapongas, onde construiria sua história. Com o passar do tempo, se envolveu ativamente no desenvolvimento do município.
Depois de se instalar com os pais no Norte do Paraná, em 1953, começou a trilhar os próprios caminhos. Primeiro como “porcenteiro” (parceiro) de um fazendeiro de café e, em 1955, inaugurou um armazém de secos e molhados. Três anos depois, ao lado do irmão Nelson Guandalini, entrou no ramo de cereais criando o Armazém Guarani, que, em 1960, viria a se tornar a cerealista Armazém Comercial de Irmãos Guandalini Ltda. com matriz em Astorga e filial em Maringá.
A agropecuária paranaense que conhecemos hoje ainda estava dando os primeiros passos naquela época, mas Guerino já vislumbrava oportunidades que vinham com a instalação das primeiras cooperativas na região. A força do associativismo e do empreendedorismo encontrou ressonância nos objetivos do jovem, que fez da união dos produtores rurais um motor capaz de levar o Estado à uma transformação econômica e social, que determinaria os contornos do seu futuro.
Com essa convicção, em 1976, passou a integrar a diretoria do Sindicato Rural de Astorga, que viria a se tornar seu segundo lar. Depois da função de diretor, assumiu a presidência da entidade em 1982, posto que ocupou até seu falecimento. No âmbito estadual, em 1988, assumiu o cargo de diretor do Conselho Fiscal da FAEP, que ocupou até 1991. A partir dali, passou ao posto de vice-presidente da entidade, onde também permaneceu até seu último dia de vida.
Em 1992, Guandalini ocupou a presidência da FAEP por seis meses, quando o presidente, Ágide Meneguette, precisou se ausentar da função. Na ocasião, o líder rural se transferiu para Curitiba, para despachar diretamente do gabinete da presidência. Guerino também foi presidente do Núcleo Regional dos Sindicatos Rurais do Norte e Noroeste do Paraná (Nurespar), que abrange 21 sindicatos rurais e 64 municípios da região, desde sua fundação, em 1989, até 2013. No ano passado, Guandalini foi homenageado como o segundo presidente de sindicato rural mais longevo do Paraná, recebendo uma placa como reconhecimento pelo esforço e dedicação ao sistema sindical rural.
Meu primeiro emprego com carteira assinada. Com ele, apendi sobre valores e ética e fui crescendo, aprendendo sobre o sistema sindical rural. Falar do Guerino é falar de uma pessoa que vai deixar uma lacuna enorme na comunidade de Astorga e do Paraná. Sempre será meu eterno professor.
João Lázaro Pires, gestor do Departamento Sindical do Sistema FAEP/SENAR-PR
Incansável, Guandalini participou de todas as grandes mobilizações do agro paranaense nas últimas quatro décadas, como a aprovação do Código Florestal, a luta contra proibição da soja transgênica, prescrição trabalhista, invasões ilegais de terras e muitas outras. Nessas e em outras ocasiões, como o Encontro Estadual de Líderes Rurais, em Curitiba, ou o Show Rural, em Cascavel, sempre fez questão de ir de ônibus com a sua comitiva, dispensando convites de avião.
“Tenho o Guerino como um grande líder, com característica de agregador, que trazia todo mundo para perto de si, sempre com uma palavra de incentivo. Sem falar que também era um grande gestor, que se preocupava com o bem da comunidade. No tempo do tratoraço, ele foi para Brasília de ônibus, junto com o seu pessoal. Ele sempre queria estar com a sua gente. É uma perda realmente irreparável para o sistema sindical rural”, lamenta Ronei Volpi, presidente da Comissão Técnica (CT) de Bovinocultura de Leite da FAEP.
Vida pela comunidade
Outro aspecto marcante da trajetória de Guerino Guandalini foi seu intenso envolvimento com a comunidade local. Sempre colocou seu tempo à disposição da sociedade e, com isso, deixa um legado de participação e amor ao próximo.
“Ele sabia mostrar caminhos, mas também sabia ouvir. Com seus interlocutores, ele fazia o contraditório, para que a discussão pudesse chegar em um denominador comum, e então fechava o circuito. Mas sempre se posicionando. Com isso, ele conquistava uma coisa muito importante: credibilidade”, destaca Antonio Leonel Poloni, assessor da presidência da FAEP e ex-secretário de Agricultura do Paraná.
Essa capacidade de dialogar com vários grupos levou-o à política. Guandalini foi vice-prefeito de Astorga entre 1977 e 1982, na gestão do então prefeito Egídio Prete, período no qual pode se dedicar inteiramente aos assuntos da cidade, tendo assumido por 60 dias o cargo de prefeito. Também foi um membro comprometido do Rotary Club.
“Ele não deixou de representar o sindicato nem um único dia. Mas além dessa dedicação ao sistema sindical rural, Guerino foi um membro participativo da vida da comunidade, como rotariano, presidente de entidades locais, cuidando das pessoas de Astorga. Uma vez, em uma conversa, ele contou que, em um ano, foi a 33 posses de clubes [do Rotary]. E sempre com um sorriso, uma palavra amiga, um abraço, um elogio”, recorda Ivo Pierin, presidente do Sindicato Rural de Paranavaí.
Guerino também dirigiu voluntariamente o Hospital Regional Cristo Rei por três gestões. Durante esse período, utilizou sua capacidade de interlocução e articulação política para trazer melhorias à saúde do município, como a instalação de um conjunto de geradores de alta capacidade na unidade hospitalar.
Também fez parte da diretoria da Escola Apae do município, desde a sua fundação em 1966. Sua vocação de amor ao próximo também se manifestava nos gestos simples, como o trato com as pessoas mais humildes, que sempre receberam uma palavra gentil e, principalmente, atenção.
“Acompanhei ele na política, na sociedade, e não tem igual. Se havia um problema, ele entrava e resolvia. Era uma pessoa apaziguadora e, com isso, sempre foi muito respeitado no Paraná. Tudo que ele fazia era para ajudar o próximo. Não deixava de dar sua opinião e com isso tinha muita credibilidade”, destaca o gestor do Sindicato Rural de Astorga, Ademil Batista Dardengo, a quem Guerino costumava chamar de “beque” e, nas últimas décadas, foi seu parceiro de todas as horas.
A religiosidade era outro pilar da sua vida. Guerino foi um dos responsáveis pela construção da Paróquia de São Sebastião, em Astorga. Integrou por 40 anos a Comissão de Economia e Finanças da Igreja Matriz de Astorga, sendo 36 como presidente.
A vida dedicada à sociedade paranaense, tanto como líder rural quanto como cidadão ativo na sua comunidade, lhe rendeu a maior honraria do Estado do Paraná. Em dezembro de 2013, Guerino foi agraciado com a Ordem Estadual do Pinheiro, recebida das mãos do governador na época, Beto Richa, em solenidade ocorrida no Palácio Iguaçu, em Curitiba.
Alegria de viver
Outro aspecto destacado por aqueles que tiveram o privilégio de conviver com Guerino era seu bom humor e alegria de viver. Anualmente, Guerino presenteava o presidente do Sistema FAEP/SENAR-PR, Ágide Meneguette, com uma bota, a chamada “botina da sorte”, que deveria ser usada nos eventos especiais.
“Ele era muito brincalhão. Certa vez, ele me questionou sobre a mandioca: ‘Quando conheci mandioca, o pessoal vendia por área. Depois passou a ser vendida por tonelada, depois por quilo, agora é por grama? [referindo-se à medida do teor de amido da raiz, que é medido em gramas]. Como é que pode, isso aí tá até parecendo ouro!’”, recorda Pierin.
Guerino casou-se com Antonia Marquini Guandalini em 18 de julho de 1953, na Igreja Matriz São Sebastião, em Astorga. Com ela dividiu a vida e teve quatro filhos: Esmeralda Josefina Guandalini Ballarotti, Elza Luisa Guandalini Guapo, Edevanir José Guandalini e Elcinéia Maria Guandalini Genaro. Antonia faleceu em outubro de 2022. Eles deixam, além dos quatro filhos, oito netos e 13 bisnetos.
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