Por Antonio C. Senkovski
A manutenção da produtividade das principais commodities agrícolas no Paraná passa pelo trigo. Pesquisadores que se dedicam há décadas ao estudo do cereal apontam que o cultivo traz inúmeros benefícios dentro dos sistemas produtivos. Alguns dos mais evidentes, inclusive, ocorrem quando o trigo já está colhido, dando espaço para soja na lavoura. Nessa circunstância, por exemplo, os efeitos benéficos causam um aumento de produtividade de até nove sacas de oleaginosa por hectare. Além disso, ocorre uma economia, em média, de R$ 130 por hectare na utilização de herbicidas na soja, segundo dados da Embrapa Soja, já que a plantação tem menos infestação por ervas daninhas. As vantagens seguem ainda muito além do plano econômico.
Todos os anos, o produtor Andreas Keller Junior, 61 anos, colhe esses benefícios na sua propriedade em Pinhão, Centro-Sul do Paraná. “Não lembro de um ano que tenha ficado sem plantar, ao menos, uma parte da propriedade com trigo”, lembra o produtor que, nesse ano, dedicou 15% dos 750 hectares da família ao cereal. “É claro que a gente planta para ter lucro, mas se tivermos um retorno pequeno sempre vale a pena, porque faz uma produção a mais no ano, o que ajuda a diluir os custos, e também agrega com a reciclagem de nutrientes no sistema”, acrescenta.
Não à toa, são quatro décadas de dedicação ao cereal. Para Keller, seguir na atividade até hoje e projetar a continuidade da produção agropecuária pela família passam pela rotação de cultura. E, para o produtor, esse processo não seria tão efetivo sem o cultivo de trigo e outros cereais de inverno. “Nos últimos anos, temos pensado sobre o cultivo de trigo. O preço está estabilizado, não está tão atrativo, mas a gente segue plantando porque considera uma necessidade. Sempre apostamos nas culturas de inverno e isso tem nos trazido resultados”, avalia o agricultor.
A percepção prática sobre os benefícios é uma realidade constatada também por quem estuda o assunto. De acordo com Henrique Debiasi, pesquisador da Embrapa Soja, com sede em Londrina, Norte do Paraná, a produtividade da soja em área pós trigo é maior. Com base nos experimentos da instituição nos últimos dois ciclos, na média, a oleaginosa rende 80 sacas por hectares em área que teve o trigo plantado, contra 71 sacas por hectare sem qualquer vestígio do cereal.
“Há ainda (nas áreas de soja após trigo) uma economia de cerca de R$ 130 por hectare com o controle de buva e amargoso, plantas que apresentam resistência ao glifosato. Não só diminui a incidência desses problemas como atrasa o desenvolvimento e ajuda na eficácia do herbicida”, constata Debiasi.
Viabilidade
João Leonardo Pires, pesquisador da Embrapa Trigo, com sede em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, defende que o cereal é viável economicamente, além do aspecto crucial para compor bons sistemas de rotação de cultura na região Sul. “Do ponto de vista de sustentabilidade das produções, depender só da soja é insustentável. Às vezes, são áreas caríssimas, em regiões com potencial produtivo elevado, e o pessoal deixar essas áreas em pousio [sem nenhum cultivo]. Isso é subaproveitar o potencial agrícola”, analisa.
Nos últimos anos, alguns mecanismos, como seguro rural e sementes melhoradas, têm contribuído para fomentar, com mais segurança, as culturas de inverno. “Uma questão importante é o risco associado às culturas de inverno. Mas hoje temos bem definido o zoneamento agrícola, opções de seguro e mecanismos que não tínhamos no passado, como o próprio melhoramento genético”, aponta. “Muitas vezes, o produtor é imediatista, só se concentra na cultura que paga mais naquele momento. Só que no médio e longo prazos, muitas vezes, essa visão leva ao insucesso”, alerta.
WinterShow apresenta estudo sobre viabilidade
Estudos sobre a viabilidade dos cultivos de inverno a curto, médio e longo prazos foram alguns dos principais temas da programação do WinterShow, no distrito de Entre Rios, em Guarapuava, organizado pela cooperativa Agrária e pela Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária (FAPA). O maior encontro técnico de cereais de inverno do país, que ocorreu de 15 a 17 de outubro, reuniu quase 5 mil pessoas, público recorde entre as 16 edições. Foram quase 90 estandes de instituições ligadas ao agronegócio e à inovação em suas mais diversas áreas, sempre com foco em culturas como trigo, cevada, canola, aveia, entre outros.
Durante o evento, o pesquisador da FAPA Juliano Luiz de Almeida destacou o fato de os produtores que incluem o trigo em seus sistemas de cultivo, com rotação de cultura, conseguirem maior receita bruta do que aqueles que adotam monoculturas. “Estamos fazendo esse experimento há 20 anos. Em nossos números, percebemos que nos primeiros anos, a monocultura até parece ser mais rentável, por gerar mais receita, mas vai diminuindo ano após ano. A partir do 6º ano, os sistemas que dedicam 25% ou 33% da área ao trigo começam a ter receitas brutas maiores do que aqueles que fazem monocultura”, revela.
Giro Técnico
Confira uma entrevista com a técnica do Departamento Técnico Econômico da FAEP Ana Paula Kowalski sobre o tema:
Veja também a matéria em formato revista.
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