A alta no dólar, que se manteve ontem em R$ 2, sustenta os preços das commodities agrícolas e rebate boa parte dos efeitos da seca registrada na última safra de grãos, conforme os analistas consultados ontem pelo Núcleo de Agronegócio da Gazeta do Povo. As previsões públicas e privadas indicam que, no Paraná, o Valor Bruto da Produção (VPB) agropecuária – a soma de tudo que se produz no meio rural com base em preços médios – tende a se aproximar do recorde de R$ 48 bilhões alcançados no ano passado, isso depois de uma quebra estimada em pelo menos 4 milhões de toneladas na colheita da soja, que rendeu um quarto a menos que o previsto.
A cotação da soja teve aumento de 19,8% em Chicago e de 21% no Brasil de janeiro até esta semana, apesar das baixas registradas desde sexta-feira, avaliou ontem Gilda Bozza, economista da Federação da Agricultura do Paraná (Faep). A renda do agricultor, no entanto, não será proporcional a essa escalada de preços. "Não dá para esquecer que tivemos quebra de safra, devemos ter um empate na renda."
A moeda norte-americana sobe em uma época em que as vendas estão adiantadas. Os produtores comercializaram até o momento 81% da soja 2011/12, conforme os índices oficiais. O câmbio promete boa cotação para os 19% restantes. E abre boas perspectivas também para o milho de inverno, que pode passar de 9 milhões de toneladas pela primeira vez, volume mais de 50% superior ao de 2011, conforme projeção do Departamento de Economia Rural (Deral) do Paraná.
O VBP vai depender ainda do rendimento no campo e dos preços dos cereais de inverno, incluindo o trigo. Outra incógnita é a renda da pecuária, que espera também sair ganhando com a influência da moeda norte-americana nas cotações das carnes bovina, suína e de frango. Por outro lado, o VBP não leva em conta os gastos dos produtores com insumos. Fertilizantes e agrotóxicos estão subindo e devem reduzir as margens de lucro nas contas de 2012/13.
A quebra registrada na colheita de verão se equipara à de três anos atrás. Em 2009, o VBP caiu 10% em relação ao ano anterior (veja quadro nesta página). É justamente esse recuo que não deve se repetir neste ano. "Em tese, a desvalorizaão do real é sempre boa para o exportador. Essa alta recente do dólar ocorre num momento em que uma boa parte da soja já foi exportada, em patamares elevados, e leva a uma elevação do VBP", disse Julio Suzuki, diretor de pesquisa do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes). O câmbio passará a pesar nas contas dos produtores se a moeda norte-americana seguir acima de R$ 2 por um período mais longo e elevar substancialmente os preços dos insumos, considera.
As previsões sobre o VBP vinham apontando queda expressiva no faturamento do agronegócio. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) apontou que o setor teria sua renda reduzida em 2,3%, para R$ 211 bilhões, com queda de R$ 3,7 bilhões no Paraná. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) estima esse índice em R$ 205 bilhões, valor 1,5% maior que o apurado em 2011. De acordo com a CNA, a pecuária é que vai elevar a renda do agronegócio, com incremento de 11,2%, atingindo R$ 146,3 bilhões.
Venda de soja antecipada reduz gastos com insumos
Embora eleve as projeções de custos para a safra que vem, o câmbio do dólar a R$ 2 fez ontem a saca de 60 quilos de soja passar de R$ 64 em Paranaguá. Se o dólar estivesse no patamar de R$ 1,75, como ocorreu em março, o produto seria comercializado a menos de R$ 57 por saca (-10%). Os preços praticados atualmente ajudam os agricultores a fecharem as contas. Isso porque a oleaginosa é uma espécie de moeda para o setor. Quem produz soja tem a opção de comprar os insumos necessários para a safra seguinte (sementes, fertilizantes e agrotóxicos) oferecendo a colheita como pagamento, mas fixando preço no melhor momento da commoditie.
"Com soja a R$ 55 aqui em Londrina, a relação de troca está entre 20 e 23 sacas por alqueire (entre 8,3 sacas e 9,5 sacas por hectare). Ano passado, o custo dos insumos estava entre 24 e 27 sacas por alqueire (10 sacas e 11 sacas por hectare)", compara Irineu Baptista, gerente técnico da cooperativa Integrada, que tem sede no município.
A alta da moeda norte-americana deve ter efeito negativo somente sobre os agricultores que ainda não compraram nem parte dos insumos para o próximo ciclo, avaliam técnicos e analistas consultados pela reportagem. "A maior parte dos agricultores aproveitou a reviravolta do mercado [alta da soja] para antecipar a compra do pacote básico para a lavoura [que inclui as primeiras aplicações de fungicidas]", afirma Robson Mafioletti, assessor técnico-econômico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar). Ele estima, no entanto, que as compras de defensivos devem se concentrar no segundo semestre. "O Paraná ainda precisa comprar 40% do volume de defensivos", projeta.
O gerente técnico da Integrada diz que 70% dos 6,5 mil associados da cooperativa já adquiriram o pacote tecnológico básico. "O produtor que fechar hoje vai desembolsar pelo menos 20% mais do que no ano passado", frisa. Baptista calcula que os produtores terão desembolso de R$ 620 por hectare com sementes, fertilizantes e defensivos no ciclo 2012/13, contra cerca de R$ 500 por hectare gastos no ano passado.
Em nota, o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola (Sindag), diz que o cenário atual não representa risco de pressão de preços sobre a indústria e se mostra otimista. "Ante esse cenário, o produtor poderá capitalizar-se para investir em tecnologia aplicada às suas lavouras nos próximos períodos", argumenta a entidade.
Fonte: Gazeta do Povo – 17/05/2012
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