O Manejo Integrado de Pragas (MIP) no Paraná vai entrar em uma nova era. Um aplicativo desenvolvido por alunos e professores da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) promete revolucionar a maneira de incluir, compilar e visualizar dados das lavouras paranaenses. A ferramenta, que será usada já na safra 2020/21, foi desenvolvida a partir de uma parceria entre a universidade, o SENAR-PR (que custeia, por meio de um convênio, duas bolsas de estudo para alunos da instituição de ensino), o Instituto de Desenvolvimento Rural Iapar Emater (IDR-PR) e a Embrapa Soja.
O SENAR-PR teve um papel decisivo no desenvolvimento da ideia e na criação do software. Há quatro anos, a entidade tem no seu catálogo de cursos o título “Inspetor em Manejo Integrado de Pragas em Soja (MIP-Soja)”. Anualmente, centenas de participantes aprendem técnicas de checagem da incidência de insetos nas plantações da oleaginosa. Assim, é possível usar de forma racional os inseticidas, deixando de fazer manejos desnecessários e utilizando os recursos do produtor de forma mais estratégica.
De acordo com Flaviane Medeiros, técnica do Departamento Técnico (Detec) do SENAR-PR, os resultados desse curso têm sido expressivos nos últimos anos. O número de turmas saltou de 18 em 2017, para 41 em 2019. Ainda, houve queda de pelo menos uma aplicação no número médio em todos os ciclos em área com MIP, comparado com áreas sem MIP. “O MIP tem feito muito sucesso entre os produtores, pois os resultados são visíveis. Inclusive, podem ser constatados na mesma safra em que ele faz o curso e emprega as técnicas aprendidas”, explica Flaviane.
Cabe lembrar que o IDR-PR também faz, com seus extensionistas, um trabalho de monitoramento de pragas, com resultados igualmente expressivos, assim como a Embrapa Soja. Inclusive, produtores, várias vezes tratados em reportagens do Boletim Informativo do Sistema FAEP/SENAR-PR, relatam que não precisaram fazer aplicação de inseticida durante a safra. Por outro lado, plantios sem MIP registram, em média, mais de três aplicações, dependendo das variáveis de cada ciclo.
Sucesso virou “problema”
Exatamente com o sucesso do MIP é que surgiu um problema. Com uma alta demanda por parte dos produtores pelos cursos do MIP, o volume de informações a ser processado todos os anos pelas instituições cresceu expressivamente. Para pegar os dados em papel de cada instrutor e colocar numa planilha, separada por propriedade, município e região, havia a necessidade de um esforço grande de tempo dos técnicos envolvidos. Eram necessários meses para se chegar aos números e resultados efetivos que as técnicas do MIP refletiam no campo.
Diante deste impasse, o professor do Departamento de Computação da UTFPR Gabriel Costa Silva, atualmente vinculado ao campus de Cornélio Procópio, viu uma oportunidade. Em 2017, ele ainda trabalhava na UTFPR de Dois Vizinhos (logo depois foi transferido) e foi chamado para uma apresentação do IDR sobre problemas do dia a dia. O objetivo era entender como a universidade poderia usar a instituição como laboratório para desenvolver soluções que ajudassem na prática do campo. Nessa conversa, entrou na pauta o MIP.
“Quando eles falaram do MIP, achei um projeto interessante e me dispus a ajudar. Então fizemos alguns protótipos de como poderia ser um aplicativo que auxiliasse no processo e, no fim do ano passado, já estávamos com uma versão de testes pronta para ser usada”, recorda o professor. “Colocamos em campo essa versão e fomos implementamos sugestões de melhorias até chegarmos na safra atual [2020/21], com uma versão já pronta para substituir as planilhas”, completa.
Edivan José Possamai, coordenador estadual do projeto grãos no Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR), se mostra animado com a novidade. “O que fizemos foi levar uma demanda concreta para a universidade. Isso ajudou a aproximar a academia do setor produtivo. Com esse trabalho consistente, o professor Gabriel tem conseguido abrir caminho para viabilizar bolsas aos estudantes envolvidos diretamente na pesquisa”, conta Possamai.
Além do professor, um aluno de mestrado e oito de graduação foram envolvidos diretamente no trabalho com o aplicativo. Dois deles tiveram bolsas financiadas pelo SENAR-PR, outros quatro com recursos de outras instituições e dois sem bolsas, que usaram o aplicativo (app) como tema de seus trabalhos de conclusão de curso (TCC).
“Esse projeto está sendo fantástico em dois sentidos. O primeiro é por contribuir para resolver um problema real, aplicando conhecimento da universidade na prática. O segundo é o fato dos alunos terem a chance de sentir as dificuldades reais quando se aplicam conceitos que eles aprendem na universidade no mundo concreto”, explica o professor.
Dados em tempo real
Com o uso do aplicativo, os dados serão compilados em tempo real. “Antes, cada instrutor tinha que preencher a planilha do participante. Agora, no app vai estar tudo pronto, basta assinalar as pragas, o número de aplicações, o que foi aplicado. O aplicativo vai facilitar muito a compilação e teremos um relatório em tempo real, o que antes era impossível”, destaca Flaviane Medeiros, do SENAR-PR. “O aplicativo vai melhorar muito a forma como o MIP é conduzido no Estado”, comemora.
O professor Gabriel complementa que será possível ter a visualização de dados de forma instantânea e com diferentes filtros, desde o nível da propriedade até a região e também o Estado como um todo. Os dados vão possibilitar, portanto, verificar como uma propriedade se difere da outra em relação à pressão de pragas e mesmo como a evolução dos problemas ocorre em diferentes regiões. “O próprio app mastiga os dados e os compila em informações, eliminando o processo manual e permitindo a de tomada de decisões mais precisa”, pontua o docente da UTFPR.
Como funciona
No ciclo 2020/21, o aplicativo manejo.app estará disponível apenas para instrutores de MIP, tanto para técnicos do SENAR-PR quanto para os do IDR-PR e da Embrapa Soja. Por enquanto, a ferramenta não será disponibilizada para o grande público. A intenção dos desenvolvedores, no entanto, é validar a ferramenta e nas próximas versões pensar em adaptar o aplicativo para uma linguagem acessível também a produtores e trabalhadores rurais.
Era digital também beneficia aulas
Com a pandemia do novo coronavírus, o SENAR-PR suspendeu todos os cursos presenciais como forma de contribuir com as medidas para reduzir a disseminação da doença. A maioria das turmas do MIP-Soja da safra 2019/20 ainda tinha uma aula pendente. Justamente nesse último encontro é apresentado os números finais, para fechamento dos índices de utilização de defensivos nas lavouras e outros dados importantes.
Em Arapoti, no Centro-Oriental paranaense, por iniciativa do Sindicato Rural, o encerramento da turma ocorreu de forma virtual, por videoconferência, no dia 14 de julho. “Foi uma forma de verificarmos o esforço de todo um ciclo para aprender novas técnicas de manejo e perceber que é possível aprimorar sempre nossa forma de produzir, caminhando sempre em direção a ser mais sustentável e ter maior rendimento”, pontua o mobilizador Ismael de Oliveira.
“Temos que aproveitar, sempre que possível, essa tecnologia. Reunir fisicamente todos os envolvidos em cursos com pessoas de cidades diferentes é difícil até para encontrar uma data. Essa modalidade de reunião virtual é bem vantajosa nessa questão e atende muito bem o propósito do curso”, avalia o engenheiro agrônomo Maurício Castanho, participante do MIP no sindicato de Arapoti.
Resultado parcial do MIP
Até o momento, o curso do MIP do SENAR-PR encerrou 17 turmas, incluindo a de Arapoti. Foram 56 iniciadas no ciclo 2019/20, com um total de 1.945,43 hectares monitorados. O SENAR-PR, agora, trabalha para marcar o encerramento de maneira remota das 39 turmas restantes, ou pelo menos daquelas que tenham infraestrutura de rede suficiente para fazer o trabalho online. Não haverá, portanto, prejuízo no levantamento de dados, apesar de o cronograma desse ano ter sido prejudicado pela pandemia.
Os dados preliminares das 17 turmas fechadas apontam que a média de dias entre a emergência da planta e a 1ª aplicação de inseticida fechou em 69 dias. A média de aplicação de inseticidas até o momento está em 1,67 nas áreas com MIP. A produtividade média nessas mesmas áreas monitoradas foi de 70 sacas por hectare.
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