“A proteção constitucional estende-se às terras ocupadas pelos índios, considerando-se, para efeitos desta ocupação, a data em que foi promulgada a vigente Constituição”.
Esse voto do ministro Celso de Mello, apoiado pelos ministros Gilmar Mendes e Carmen Lúcia resume a decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 29087. O Recurso tratava da questão de posse indígena em uma fazenda, no Mato Grosso do Sul, que havia sido declarada, pela União, como área de posse imemorial (permanente) da etnia guarani-kaiowá, integrando a Terra Indígena Guyraroká.
Em português claro: Isto quer dizer que somente serão consideradas terras indígenas aquelas por eles ocupadas em 5 de outubro de 1988.
“Essa decisão significa uma vitória dos produtores rurais de todo o Brasil, no sentido de garantir a estabilidade jurídica reclamada pelo setor produtivo em relação à demarcação de terras indígenas”, disse o presidente da FAEP, Ágide Meneguette ao ser informado da decisão.
Para os parlamentares da Frente Parlamentar Agropecuária, “ isso deve servir para reflexões dos antropólogos da Funai, que por esse Brasil adentro saem a demarcar a torto e a direito terras produtivas sem observar o marco temporal de 5 de outubro de 1988 do artigo 231 da Constituição”.
O STF decidiu reformar acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que havia indeferido mandado de segurança com o qual o proprietário da fazenda buscava invalidar a declaração da área como terra indígena. Assim, o Supremo definiu que os referenciais fixados no julgamento do caso Raposa Serra do Sol devem servir de base para a decisão de casos semelhantes que envolvam demandas indígenas sobre terras produtivas.
Sem índios há 70 anos
O relatório de identificação e delimitação da Terra Indígena Guyraroká, segundo o ministro Celso de Mello, indicou que a população indígena guarani-kaiowá residiu na área, objeto de disputa, até o início da década de 40. Deste modo, definiu: “há mais de 70 anos não existe comunidade indígena na área, portanto não há que se discutir o tema da posse indígena”, afirmou o ministro Celso de Mello.
Ele ressaltou, ainda, o alcance das condicionantes expressas na decisão do STF no caso Raposa Serra do Sol: “Trata-se de orientações que não são apenas direcionadas àquele caso, mas a todos os processos sobre o mesmo tema.” Segundo o consultor jurídico da CNA, Carlos Bastide Horbach, “este julgamento é mais um precedente que reforça a jurisprudência do Supremo no sentido de serem as condicionantes aplicáveis a todos os processos envolvendo demarcações de terras indígenas”.
Ao ser estabelecido pelo STF o marco temporal da data em que a Constituição foi promulgada, como há muito vem defendendo a CNA e a FAEP, incorpora-se um componente fundamental para a paz no campo. Afinal, a decisão determina que ocupações posteriores a esta data não contam com o benefício da proteção constitucional
A decisão deixa claro que, quando houver necessidade comprovada de uma nova demarcação envolvendo terras legalmente tituladas em nome de produtores rurais, o Estado deverá substituir o processo convencional de demarcação por uma “declaração expropriatória”. Isto deverá implicar a abertura de um processo de desapropriação, com pagamento de justa indenização aos proprietários. Na demarcação convencional, com base no artigo 231 da Constituição, os produtores recebem apenas pelas benfeitorias.
As questões de terras indígenas vem ocorrendo em vários estados do país. No Paraná, recentemente, ocorreram episódios no extremo-oeste do estado (veja pg 4) e só no Mato Grosso do Sul, são 86 as fazendas produtivas hoje invadidas por indígenas.
Invasões no Paraná
No Paraná, a truculência da direção da Funai ficou patente em diversos episódios. Em agosto de 2012, índios vindo clandestinamente do Paraguai fecharam a ponte Ayrton Senna, entre as cidades de Guaíra (PR) e Novo Mundo (MS) e invadiram 16 propriedades rurais, levando um clima de insegurança à população.
As áreas invadidas no Paraná pelos índios paraguaios, segundo a Funai, seriam territórios históricos de ocupação indígena, porém, estas terras eram ocupadas e consolidadas por produtores rurais, que possuem títulos de propriedade expedidos pelo governo federal, desde o início do século passado. Além disso, os índios já estavam fixados a gerações no país vizinho, inclusive tendo abandonado os costumes indígenas e bastante incorporados ao meio urbano.
Na ocasião, arquivos da Itaipu Binacional que guardam o levantamento realizado no início dos anos 70 do século passado comprovam a ilegalidade das invasões. A Binacional não identificou áreas que hoje poderiam ser enquadradas no § 2º do artigo 231 da Constituição Federal como áreas “tradicionalmente ocupadas pelos índios”. A própria Embrapa assegurou na época não existirem índios em pelo menos quatro das áreas invadidas no Oeste do Paraná.
O que ficou patente na operação foi a conduta questionável da Funai e das Organizações Não Governamentais (ONGs) por ela orientadas, para criar um clima de insegurança jurídica e o emprego arbitrário da força para a ocupação ilícita de imóveis rurais para promover demarcações arbitrárias.
Em fevereiro de 2013, os dirigentes da FAEP, da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e da Federação da Agricultura do Maro Grosso do Sul (Famasul) reuniram-se com a então ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, para debater as invasões indígenas em propriedades rurais de Guaíra e Terra Roxa. A resposta do governo a esta questão foi um ofício da Funai que criou um grupo técnico de trabalho para realizar estudos de demarcação de áreas.
A ação desagradou até mesmo o prefeito de Guaíra, Fabian Vendruscolo, do PT, que se mostrou preocupado com a atitude da Funai em constituir um grupo técnico para realizar a delimitação de terras à revelia do município. Segundo ele, na época havia inúmeras ocupações ocorridas em Guaíra e Terra Roxa, sob a apreciação da Justiça Federal, mas que não possuíam qualquer procedimento administrativo em elaboração na própria Funai para estudo de demarcação. No seu entender, essas áreas deveriam ser reintegradas aos seus proprietários legais.
No dia 19 de abril de 2013 – data em que se comemora o Dia do Índio -, a situação já havia se agravado bastante, inclusive com episódios de violência (houve o assassinato de um produtor rural por índios em Douradina, no Mato Grosso do Sul). Nesta data, enquanto centenas de índios ocupavam, de forma violenta, a Câmara Federal e o Palácio do Planalto, em Brasília, o presidente da FAEP, Ágide Meneguette conversava com lideranças rurais no Oeste do Estado, com objetivo de encontrar uma solução para o impasse.
Fonte: Sistema FAEP
Comentar