A inflação está se espalhando pelos maiores países emergentes do mundo, causando ruído naqueles que têm sido os motores do crescimento global nos últimos anos.
Os bancos centrais do Brasil, Rússia, Índia e China, os chamados países do Bric que são agora responsáveis por quase um quinto da atividade econômica mundial, aumentaram as taxas de juros nas últimas semanas e estão testando medidas mais exóticas para estancar o avanço dos preços, especialmente o de alimentos: a Índia e a Rússia proibiram as exportações de cebola e trigo, respectivamente, enquanto a China prometeu controles de preço para itens como o óleo de cozinha.
O Brasil informou na sexta-feira que a inflação de 2010 ficou em 5,9%, a mais alta em seis anos, o que aumenta as chances de que os já elevadíssimos juros do país subam ainda mais, com possível efeito sobre o crescimento.
É certo que a inflação brasileira ainda está muitíssimo longe dos níveis estratosféricos do início dos anos 90. Alguns analistas também dizem que os temores de uma espiral inflacionária nos mercados emergentes são exagerados, com taxas ainda inferiores às do auge dos preços antes da crise financeira de 2008.
Ainda assim, a tendência de inflação está criando dores de cabeça para as autoridades, de Pequim a Nova Déli, como o temor de que a alta dos preços dos alimentos ponha em risco a estabilidade social.
"A inflação é um dos maiores riscos para este ano", diz Nicholas Kwan, economista do Standard Chartered em Hong Kong.
A aceleração na alta dos preços no mundo em desenvolvimento contrasta com os baixos índices de inflação na Europa e nos Estados Unidos e com os persistentes declínios no Japão. A divergência é em parte um subproduto das recuperações econômicas mais fortes dos países em desenvolvimento, em comparação com o crescimento anêmico dos países ricos. Essa disparidade complica as tentativas de combater a inflação no mundo em desenvolvimento, dizem os economistas.
Os líderes brasileiros e de outros países reclamam que a decisão do Federal Reserve, o banco central dos EUA, de injetar US$ 600 bilhões na economia promove a inflação de commodities e bolhas de ativos ao enfraquecer o dólar. O presidente do Fed, Ben Bernanke, disse na sexta-feira que a medida não está alimentando a inflação.
Uma recuperação melhor do que o previsto nos EUA pode alimentar a inflação ao provocar um surto de demanda na cadeia global de fornecimento, fazendo com que economias que já operam a plena capacidade superaqueçam, dizem economistas. "Estamos chegando a um ponto em que as exigências das economias emergentes serão suplantadas pelas políticas das economias avançadas", diz o economista Eswar Shanker Prasad, da Universidade Cornell, dos EUA.
O Brasil estabeleceu uma das taxas de juros mais altas do mundo para conter a inflação agora que o crescimento econômico se aproxima de 7% e houve aumento nos gastos públicos para reduzir a pobreza.
A taxa Selic de 10,75% atraiu uma enxurrada de investimento especulativo dos EUA e do Japão, onde a política monetária é de dinheiro barato para estimular o crescimento.
Em consequência disso, o real subiu mais de 35% em relação ao dólar americano desde 2009, o que torna as exportações menos competitivas. Para evitar novos aumentos dos juros, o governo brasileiro está tentando outras medidas, como a restrição de crédito com aumento do compulsório no câmbio.
Esse é um grande teste para o novo governo de Dilma Rousseff. Embora Dilma tenha feito campanha em cima do aumento dos gastos sociais, ela está agora avaliando politicamente arriscados cortes nas despesas para encolher os déficits e esfriar a economia.
A inflação de 5,1% na China no acumulado de 12 meses até novembro foi impulsionada principalmente pelos preços dos alimentos, que subiram 11,7%. Mas o núcleo da inflação, que exclui energia e alimentos, também subiu: 1,9% nos 12 meses.
A China lançou uma série de medidas para conter os preços, como duas altas dos juros, uma ligeira valorização da moeda, menor disponibilidade de crédito, controles de preço e iniciativas para erradicar a especulação ilegal em alimentos.
Na Índia, onde os preços dos alimentos impulsionaram a inflação em boa parte de 2010, as expectativas eram de que uma sólida safra de arroz e outros produtos básicos amenizasse a pressão. Mas os mais recentes dados do governo mostram que a situação dos alimentos não foi resolvida e a inflação aumentou recentemente no país. Economistas dizem que o Banco da Reserva da Índia, o BC do país, que já elevou os juros seis vezes em 2010, vai quase certamente aumentá-los novamente quando fizer reunião no dia 25.
A previsão é de que a economia indiana cresça 8,75% no ano que termina em 31 de março, segundo um relatório do Fundo Monetário Internacional divulgado na quinta-feira. Mas a inflação ameaça minar os ganhos econômicos para as centenas de milhões de indianos de baixa renda.
Amrith Mathur, um engenheiro de software de 36 anos que comprava verduras e legumes num mercado atacadista de Nova Déli na sexta-feira, disse que as altas de preços praticamente anularam seus ganhos salariais. "Consegui um pequeno aumento de 5% no salário depois de dois anos este ano, mas, graças aos preços de commodities essenciais que dispararam, o aumento foi a mesma coisa que nada", disse. "Como o governo pode alcançar sua elevada meta de crescimento de 9-10% se o poder de consumo das pessoas diminui a cada dia", disse.
Na Rússia, secas fizeram com que os preços do trigo disparassem e derrubaram a meta do governo de manter a inflação na faixa de 6% a 7% em 2010. O país informou semana passada que os preços ao consumidor subiram a taxas mais altas que o esperado de 1% em dezembro e 8,7% ao longo do ano, aumentando as expectativas de altas dos juros nos próximos meses.
Outras grandes economias também tiveram altas dos preços maiores do que se esperava nos últimos meses.
O Peru surpreendeu com um aumento de juros na semana passada e o México divulgou uma inflação acima do previsto de 4,4%. A Tailândia deve elevar os juros esta semana. A Coreia do Sul também informou que vai apresentar medidas para enfrentar a alta dos preços esta semana.
Fonte: The Wall Street Journal
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