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Atraso no plantio dos EUA abre oportunidades para produtores paranaenses

Americanos enfrentam o maior volume de chuva desde 1883. Há registros até de tornados em parte do cinturão agrícola

Nessa época do ano, as lavouras do cinturão do milho (Corn Belt) dos Estados Unidos deveriam estar cobertas de pequenas plantas do cereal e soja emergindo do solo. Mas na maior parte dos Estados que compõe as áreas produtivas norte-americanas, o que se vê são campos inundados, máquinas paradas e prejuízos a perder de vista. O mau tempo, que inclui o maior volume de chuvas da história e até mesmo furacões, está travando o avanço da semeadura da safra 2019/20 no maior produtor de grãos do mundo. E isso tem deixado os mercados agitados, inclusive no Brasil, onde os especialistas indicam a abertura de uma janela de oportunidades.

Baixe o áudio do Boletim sobre a safra americana.

Números do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) mostram que nunca, na história, o plantio dos Estados Unidos esteve tão atrasado como neste ano (ver gráfico). O período ideal para o plantio do milho acabou na primeira semana de junho em todos os Estados. Para piorar, o calendário de semeadura para a soja se fecha nas próximas duas semanas. Apesar disso, ainda há pelo menos 40 milhões de hectares das duas culturas sem que sementes tenham ido ao chão, segundo estimativas de consultorias americanas.

E a previsão do tempo é desanimadora. Em lugares como o Missouri e Chicago, onde houve, respectivamente, 300% e 250% de chuva acima da média em maio, a previsão é de que sigam ocorrendo de forma intensa nas próximas semanas.

Terra arrasada

Já é dado como certo um significativo volume de áreas que não terão plantio nesta temporada, apesar de não haver estimativas oficiais do USDA. É o que explica o diretor da consultoria ARC Mercosul, com sede em Chicago, Matheus Pereira. “O que presenciamos é uma situação de calamidade. É impossível que o produtor americano consiga cobrir toda a área prevista para plantio inicialmente”, diz o especialista (ver gráfico na página seguinte). “Temos que lembrar que a chuva nos Estados Unidos é muito mais agressiva em termos de prejuízos do que a seca, pois o solo é muito mais argiloso que o brasileiro. Então, se chove, ele retém muita água e depois que a umidade penetra no solo, dificilmente é dissipada”, completa.

No universo dos produtores rurais estadunidenses, 85,7% contrataram seguros agrícolas, com apólices que possuem cláusulas do que se chama de prevenção de plantio. “Nessas últimas semanas, temos dado mais atenção à análise de viabilidade de adesão ao Programa de Prevenção de Plantio, que paga literalmente para aquele talhão não ser semeado”, revela. “Mas acontece que os americanos possuem estoques de nível recorde da última safra, perto de 50 milhões de toneladas de soja. Por mais que seja uma safra com problemas climáticos, ainda assim temos muito estoque. As oportunidades para os brasileiros serão, na minha opinião, de curto prazo. A safra não vai ser grande, mas vai empilhar safra sobre estoque”, pondera.

Guerra comercial

A analista de mercado Ana Luiza Lodi, da INTLFCStone, avalia que a situação nos Estados Unidos está, sim, complicada, mas que é preciso esperar para saber qual será a área efetivamente plantada antes de especular o mercado. “Nesse momento, as atenções estão voltadas para clima nos Estados Unidos, mas temos também a guerra comercial com a China. Por mais que os dois países estejam em diálogo, houve um acirramento recente e isso favoreceu os preços aqui no Brasil (ver prêmio da soja na página seguinte). Porque se, realmente, for olhar a questão da tarifa imposta pelos EUA (25%), é mais vantajoso comprar soja do Brasil”, avalia.

A demanda chinesa por soja com os problemas enfrentados pelo país asiático com a peste suína também gera preocupação por parte dos analistas. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima que pelo menos 2,6 milhões de animais precisaram ser sacrificados nos últimos meses. “Os países levam um tempo para se ajustar quando ocorre esse tipo de problema. Se a China começar a comprar muita carne, os mercados de grãos também têm que se ajustar. Nessa hipótese poderia haver um período de demanda um pouco mais fraca pela soja, mas é preciso esperar [ver gráfico das importações de soja pela China ao lado]”, reflete.

Peste suína e demanda

Para o diretor do SIMConsult, Liones Severo, a questão da peste suína na China está relativamente assentada, com um progresso considerável da vacinação pelo país e outras medidas adotadas, como o abate dos suínos saudáveis um pouco mais pesados, com 150 quilos ao invés de 110 quilos. Outro aspecto está no aumento do
alojamento de frangos e a produção de ovos, para compensar a oferta de proteína animal aos consumidores chineses. “Não dá para subestimar os chineses. Não vai  iminuir a demanda, eles têm comprado muita soja no Brasil”, enfatiza.

Severo concorda que a situação dos Estados Unidos é dramática, com efeitos bastante significativos ara o mercado internacional. “Vai impactar muito nos preços. Com o produtor americano deixando de plantar muito milho, a quebra irá engolir todo o estoque. O governo vai indenizar áreas afetadas por enchentes. Condados inteiros estão declarando área de desastre federal. Tanto a soja como o milho, as indenizações pagas pelos seguros vão remunerar muito mais do que se o produtor fosse plantar”, prevê.

Ainda, de acordo com o especialista, o cenário ruim nos Estados Unidos irá favorecer o mercado brasileiro. E, para Severo, não apenas no curto prazo. “Os brasileiros serão favorecidos, porque milho está muito barato no mundo, e vamos ganhar muito preço. Na soja, temos um bom volume para negociar, e podemos ter avanços. Tem uma grande oportunidade disso acontecer, mas o produtor ainda deve esperar, porque é completamente imensurável a capacidade do mercado subir para o ano que vem. Pode ir em direção das máximas de todos os tempos. O desenho de preços é esse. A não ser que fique muito bom o tempo de uma hora para a outra e que a safra se recupere, o que não parece que vai acontecer”, considera.

Prêmio e preços

A guerra comercial entre China e Estados Unidos tem sido um dos principais fatores a mexer no chamado prêmio pago à soja brasileira. O valor é definido por uma série de fatores e pode ser acrescentado (ágio) ou retirado (deságio), dependendo do equilíbrio desses elementos (guerra comercial e chuva no porto, respectivamente, por exemplo). Os conflitos entre China e Estados Unidos têm feito o prêmio pago pela soja brasileira subir. No contrato de julho de 2019, para se ter ideia, em maio de 2016 eram pagos US$ 0,80 por saca. No começo de maio de 2019, esse valor estava em US$ 0,45 e chegou no fim do mês a US$ 1,16 – aumento de 157%.

A evolução de preços em Chicago, no período de 1º a 31 de maio, foi de US$ 8,51 para US$ 8,72, o que representa 2,46%. A influência do prêmio maior refletiu na cotação interna da soja no Paraná.

Em Cascavel, por exemplo, o preço da soja estava em R$ 63,50 no início de maio e bateu R$ 71,50 no dia 29 de maio – aumento de 12,6%. Isso freia um pouco essa tendência de alta o câmbio, que tem se desvalorizado com as expectativas de aprovação da Reforma da Previdência aqui no Brasil e possível melhora nos índices econômicos nacionais, como pode ser constatado na análise no Boletim Informativo.

Antonio Senkovski

Repórter e produtor de conteúdo multimídia. Desde 2016, atua como setorista do setor agropecuário (do Paraná, Brasil e mundial) em veículos de comunicação. Atualmente, faz parte a equipe de Comunicação Social do Sistema FAEP. Entre as principais funções desempenhadas estão a elaboração de reportagens para a revista Boletim Informativo; a apresentação de programas de rádio, podcasts, vídeos e lives; a criação de campanhas institucionais multimídia; e assessoria de imprensa.

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