Depois de um tombo histórico na Safra 2021/22, os produtores rurais do Paraná se preparam para retomar o fôlego na corrida pela produtividade nos grãos. Até então, apesar do alongamento do ciclo por conta de temperaturas mais baixas que o normal no início do plantio e alguns problemas localizados, o Estado deve colher uma safra de soja recorde, batendo as 20,7 milhões de toneladas do ciclo 2019/20. Essa é a constatação da equipe da revista Boletim Informativo, que promoveu o Giro da Safra por cinco regiões do Estado, para constatar como está o andamento da temporada 2022/23. A viagem ocorreu entre os dias 6 e 10 de fevereiro, passando pelas regiões de Guarapuava, Cascavel, Campo Mourão, Maringá e Tibagi.
As máquinas devem tirar do campo mais de 21 milhões de toneladas de soja, segundo o Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento (Seab), nove milhões a mais em relação ao último ciclo, quando a produção mal passou das 12 milhões de toneladas. Por isso, com praticamente tudo jogando a favor das lavouras, há uma sensação de otimismo no campo.
“Depois de temporadas com perdas severas, essa safra tem tudo para ser cheia, permitindo que o produtor volte a se capitalizar. E sabemos que quando o campo vai bem, a economia dos municípios do Paraná vai bem também”, afirma Ágide Meneguette, presidente do Sistema FAEP/SENAR-PR.
Na região de Guarapuava, onde o produtor Rodrigo Schneider cultiva 850 hectares, nos municípios de Pitanga, Candói e Foz do Jordão, que tem a peculiaridade de ser mais fria e não plantar milho segunda safra. Schneider realizou o plantio de forma escalonada, o que vai resultar em colheitas em diferentes épocas (do fim de fevereiro até o começo de abril). “O plantio no período intermediário de 20 de outubro a 5 de novembro é o que temos de melhor. Nas nossas áreas, temos lavouras que devem dar de 50 até 70 sacas por hectare”, compartilha.
O produtor destaca que o clima tem ajudado, tanto em relação à chuva quanto aos períodos de sol firme para dar segurança nas aplicações de defensivos. Ainda assim, alguns problemas preocupam os agricultores da região, como a ferrugem asiática, o mofo branco e ervas daninhas resistentes a herbicidas. “Esperamos uma safra de 80% de aproveitamento para mais. Ainda preocupa a soja que teve plantio mais tarde, pois temos receio de uma epidemia de algum tipo de doença em fim de ciclo. Essa soja está tratada, mas temos medo dos fungicidas com baixo nível de controle”, ressalta Schneider.
Susto com estiagem no Oeste
Na região Oeste, as perspectivas também seguem positivas, com relatos da possibilidade de colher, em média, 70 sacas por hectare. Isso mesmo com o susto de uma estiagem, que deve provocar perdas em algumas áreas. Com temperaturas mais quentes, os produtores dessa parte do Estado apostam na segunda safra de milho. Por isso, o plantio da soja precisa ocorrer mais cedo e de forma rápida, como aconteceu na propriedade da família de Renato Archile Martini, que dedicou 340 hectares à oleaginosa. Ao todo, foram gastas apenas 50 horas para semear a área.
“Nós tivemos um susto entre 12 de dezembro e 2 de janeiro, período no qual ficamos sem chuva. Depois disso, voltou a chover normalmente e a soja se recuperou. A soja é uma planta mais tinhosa, ela aguenta o desaforo até um certo ponto”, detalha Martini. “Tivemos um tempo mais frio que a média. O normal seria já estarmos colhendo, mas houve um atraso de 12 dias no ciclo pelas temperaturas mais baixas esse ano”, completa o produtor rural, que prevê semear 300 hectares de milho safrinha após a colheita da soja.
Na mesma região, Agassiz Linhares Neto semeou, em apenas três dias, 340 hectares de soja. Assim como todos os produtores ouvidos pela reportagem, a maior preocupação desse ciclo é com os custos de produção. Nas contas de Neto, houve um aumento de R$ 2 mil por hectare para a compra de fertilizantes. Com diesel, a média de gastos dobrou. “Nós estamos com uma sensação de retomada após um período muito ruim”, compartilha Linhares.
Em Maringá, chuva na hora certa
O produtor Cleber Veroneze Filho, de Maringá, mostra, com entusiasmo, os seus 490 hectares de soja. A empolgação decorre da expectativa de uma das melhores lavouras que já conduziu, graças à colaboração do clima. Veroneze plantou dentro de uma boa janela para entrar com milho safrinha na sequência em 75% da área. “O único percalço é que em algumas áreas plantadas mais tarde, a soja acamou um pouco, mas acredito que não vá afetar a produtividade. Estamos esperando em torno de 75 a 80 sacas por hectare”, projeta o agricultor.
Em Itambé, município vizinho, o produtor Gilmar Cumani também celebra a boa distribuição de chuvas nesse ano e o bom controle de pragas e doenças, com a possibilidade de aplicações nos momentos certos. Nos seus 320 hectares, a média deve ficar próxima das 70 sacas por hectare. “Na nossa região, tivemos frustrações em três das quatro últimas safras. Acabamos gastando nossas reservas e ficando descapitalizados. Esperamos que a boa colheita se confirme para podermos respirar um pouco”, diagnostica Cumani.
Cartão postal do Guartelá
Tibagi é reconhecida pelas suas belezas naturais como uma parada obrigatória no itinerário turístico do Paraná. A pouco mais de um quilômetro da entrada do famoso Cânion Guartelá, na propriedade de Fredy Nicolaas Biersteker, a soja está digna de um cartão postal. Seus 300 hectares receberam chuva na hora certa e devem resultar, em média, em 70 sacas por hectare. O ponto de atenção corresponde aos custos de produção.
“Nesse ano temos que produzir em torno de quatro sacas a mais para pagar os insumos, principalmente em decorrência das altas do dólar e a queda do preço da soja em relação ao ciclo anterior. O lado bom é que teremos uma safra cheia, o que ajuda a compensar a relação de troca”, pontua o produtor, também dono de um restaurante voltado a turistas.
O vizinho de Fredy, Guilherme Frederico de Geus Filho, plantou 950 hectares com soja e, com as boas condições de clima, espera colher 75 sacas por hectare. Essa produtividade será alcançada mesmo com um certo atraso no plantio por conta da pouca chuva e temperaturas mais frias, que alongaram o ciclo. A família de Geus conta com uma estrutura para armazenar a própria safra, o que deve fazer a diferença esse ano. “As previsões são de uma safra gigantesca no Brasil e América do Sul. Então o produtor precisa ficar de olho na hora de vender”, orienta.
Mais soja, menos milho
O milho verão no Paraná vem perdendo espaço para a soja ciclo após ciclo, mas ainda assim representa um volume significativo de grãos para o abastecimento da agroindústria, em especial a produção de ração animal. Em 2022/23, devem entrar nos armazéns em torno de 3,7 milhões de toneladas do grão. De modo geral, os produtores que dedicam área ao milho verão usam o cultivo como rotação de cultura. No Paraná, 380 mil hectares foram dedicados ao cereal e quase 6 milhões à soja.
O produtor Fredy Nicolaas Biersteker, de Tibagi, por exemplo, dedicou 80 hectares de milho verão e 300 hectares para a soja. Na lavoura do cereal, Biersteker está esperando colher 200 sacas por hectare, já que o tempo favoreceu o andamento da lavoura.
Outro exemplo de cultivo de milho verão é do produtor Henrique Salonski, de Campo Mourão, que dedicou 290 hectares ao milho e 1,2 mil hectares à soja. O andamento do milharal também segue positivo, com expectativa de colher algo próximo à produtividade de Biersteker.
Coamo prevê bater 100 milhões de sacas
Em Campo Mourão, a estiagem do Oeste não ocorreu e a expectativa de produção é de safra cheia. A região é sede da maior cooperativa da América Latina, a Coamo, que prevê, neste ciclo, colher 100 milhões de sacas de soja. O bom resultado vem após um tombo de 48%, ou seja, a colheita de 52 milhões de sacas de soja na temporada passada. Toda essa produção de 2022/23 deve gerar um problema de armazenagem (não apenas na região, mas em todo o Estado), já que ainda há muito grão dos últimos ciclos estocados, devido às incertezas que ocorreram em função da troca de governo. “A promessa é de uma ótima safra. Depois da quebra, vai ser bom ter uma safra cheia para o produtor se recuperar e se capitalizar”, diz o presidente da Coamo, Aroldo Gallassini.
No município campo-mourense, o produtor rural Henrique Luiz Salonski semeou 1,2 mil hectares com soja. Seu grande trunfo é ter capacidade própria para armazenar 180 mil sacas de grãos. Assim, além de vender produto como associado da Coamo, ele consegue comercializar grãos também diretamente para os exportadores. Já houve contratos nos quais Salonski obteve ganhos de mais de R$ 10 por saca acima do preço praticado no balcão. “Agora, estamos na fase de esvaziar os silos para colocar a safra nova. Ainda temos um pouco de trigo e soja guardados do ciclo passado”, revela Salonski.
Logística: safra nova, problemas antigos
A reportagem do Boletim Informativo rodou cerca de 1,5 mil quilômetros pelo Paraná e encontrou um cenário de deterioração das rodovias. A infraestrutura logística, que será amplamente demandada para o escoamento da safra de grãos nos próximos meses, está sob um impasse a respeito do modelo de concessão de pedágios. Na prática, a lentidão está levando as rodovias do Paraná ao sucateamento.
A indefinição no modelo de concessão de pedágio faz com que as estradas se deteriorem a cada dia. Em vez de postos de atendimento aos usuários, boa sinalização e obras de recuperação constantes, o que se encontram são apenas operações tapa-buracos, rodovias com mato crescendo nos canteiros centrais e acostamentos e, em alguns locais, as placas de sinalização já estão quase cobertas pela vegetação.
Os buracos, que pareciam ter ficado no passado das rodovias do eixo de integração logístico do Estado, voltaram a ser protagonistas das viagens. Agora, além de toda a atenção usual exigida dos motoristas, o zigue-zague para desviar de “panelas” no caminho também é uma preocupação constante dos condutores. Tudo isso resulta em mais tempo de viagem, risco de acidentes, carros enguiçados e dinheiro do setor produtivo paranaense indo para o ralo, pela precarização das estradas.
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